quinta-feira, 28 de abril de 2011

A cura começa pelo olhar


Entenda sobre a hanseníase e a importância da auto-observação
Ana Gabriela Oliveira

           "As pessoas tem que estar atentas ao próprio corpo e atentas aos sintomas. Às vezes é uma manchinha que no início a pessoa não percebe ou não dá atenção. Observe seu corpo, suas mãos. Observe. Se alguma coisa acontecer de diferente, se aparecer algum sintoma da hanseníase, procure uma unidade de saúde para auxiliar no diagnóstico. O diagnóstico precoce é fundamental para a cura do paciente e para a não disseminação da doença”, afirma a coordenadora da Epidemiologia da Secretaria de Saúde de São João del –Rei, Eliene Freitas, em alerta sobre a importância do diagnóstico precoce da hanseníase.
           A hanseníase é uma das doenças mais antigas que ainda atinge o homem. Além de, em estágio avançado, causar sequelas como úlceras, perda da força muscular e deformidades, a doença de Hans já segregou milhares de brasileiros nos antigos leprosários. Agora, o tratamento da doença não é mais pautado na reclusão, mas em antibióticos, e o diagnóstico precoce evita as sequelas. A hanseníase tem cura e é fácil de tratar.
A dermatologista Valéria Azevedo Junqueira, que atende os casos de hanseníase na Policlínica Central de São João del-Rei, explica que a doença é causada pelo bacilo Mycobacterium leprae, e a transmissão se dá pelas vias aéreas: uma pessoa com a forma infectante da doença, e que não tenha iniciado o tratamento, pode passar o bacilo por meio de secreções nasais, tosses e espirros.
O contato direto e prolongado com o doente em ambientes fechados, pouco ventilados e com pouca luz solar aumenta a chance de infecção. Muitas pessoas têm o organismo resistente ao mycobacterium leprae, por isso poucas das que contraem o bacilo adoecem. Entretanto, condições de vida precárias, desnutrição e outras infecções simultâneas, aliada a pouca informação, podem favorecer a proliferação da doença.
Valéria Junqueira também esclarece que os sintomas mais frequentes são manchas brancas ou vermelhas, caroços ou nódulos com perda da sensibilidade, e o surgimento de áreas anestésicas (sensação de dormência), em locais como mãos e pés, por exemplo.
O diagnóstico da hanseníase é feito por meio de exame clínico, nas unidades básicas de atendimento ou nas equipes do Programa de Saúde da Família (PSF). No tratamento, chamado poliquimioterapia (PQT), o paciente toma antibióticos administrados mensalmente e de forma supervisionada pela equipe de saúde e consome doses diárias em casa. A dermatologista explica que o tratamento é gratuito, e o remédio é fornecido pelo Ministério da Saúde. Em São João del–Rei, quem suspeitar que está com a doença pode procurar atendimento nas equipes do PSF nos postos de saúde mais próximos de casa ou na Policlínica Central.

Minas Gerais registrou 1.523 casos de hanseníase em 2010

           No Brasil, o índice da hanseníase é alto, com cerca de 47 mil novos casos detectados por ano. Apesar de não estar entre as regiões mais endêmicas do país, que são o norte, nordeste e centro-oeste, Minas Gerais registra altos índices da doença. De acordo com a Gerência Regional de Saúde de São João del-Rei, foram contabilizados 1.523 casos em todo o estado durante o ano de 2010. A região de Governador Valadares é a mais preocupante, com 263 ocorrências, segundo levantamento preliminar do governo. Na zona regional de São João del–Rei, que envolve mais 19 cidades vizinhas, foram contabilizados seis casos no último ano.
          Segundo a secretaria municipal de Saúde de São João del -Rei, os seis casos foram registrados na cidade. Apesar da baixa incidência, a técnica em controle de hanseníase do órgão do estado, Aderlaine Neri, estima que outros casos ocorram sem serem notificados. Ela acredita que não são registrados mais casos na região, porque as pessoas, muitas vezes, não procuram o atendimento e não é feito o diagnóstico.
          De acordo com Neri, os recursos do governo do estado atendem às necessidades básicas ligadas à hanseníase, como medicamentos e profissionais capacitados, mas não suprem a demanda por investimento em informação. Para a técnica, falta veiculação de campanha em mídias populares e em horários que atinjam o trabalhador. “O maior problema sobre a doença é a falta de informação”, critica.

Estigma

          Duas das grandes marcas da hanseníase sempre foram o medo e o preconceito. Antes conhecida como lepra, ela segregou muitos brasileiros. Em todo o país, havia os leprosários, onde as pessoas buscavam tratamento e eram excluídas dos não doentes. O mais famoso leprosário de Minas, a Colônia Santa Isabel, em Betim, foi clausura para portadores de hanseníase de todo o país. A colônia, fundada em 1931 e a maior de todas da América Latina, era cercada com correntes para impedir o contato entre doentes e pessoas saudáveis. Eram comuns os casos de pessoas que, ao ter a doença detectada, iam para os leprosários e nunca mais tinham contado com familiares.
          O estudo da doença comprovou que o isolamento não era a melhor forma de ação e, oficialmente, a prática foi considerada extinta no Brasil em 1962. O tratamento poliquimioterápico, com o uso combinado de antibióticos, passou a ser o mais indicado.
          Depois de anos de segregação, os leprosários mudaram o seu perfil. Muitos foram transformados em hospitais gerais, como é o caso da Santa Isabel, e outros em centro de pesquisa. Até hoje, muitas pessoas que passaram a vida internadas continuam nesses locais, pois perderam os laços afetivos e sociais com a “sociedade saudável”, a qual foram obrigadas a abandonar. A forma de tratamento da doença mudou, e o preconceito vem diminuindo. “Tem preconceito, mas já não é a mesma coisa que antigamente, pelo menos na região”, destaca Valéria Junqueira.
           Juliana de Carvalho, que há um ano faz tratamento na Policlínica Central de São João del-Rei, terminou o tratamento na última quarta-feira, dia 13 de abril. Ela disse que nunca viveu uma situação de preconceito. Entretanto, a paciente evitava falar às pessoas que doença tinha. Nos dias de consulta médica, ela saia do trabalho falando que ia fazer um tratamento na Policlínica, mas não dava nome para a doença pelo receio de como as pessoas iriam reagir.
          A informação também ajuda em outra mudança do olhar, além do incentivo à auto-observação do corpo. Quanto mais as pessoas sabem sobre a doença, mais diminuem o preconceito e o estigma da hanseníase. “É importante a informação, para a pessoa não ficar desesperada, porque [a doença] não é uma coisa tão assustadora não. Eu achava que era, mas não é não”, diz Juliana de Carvalho.
          “Quando você tem conhecimento do que realmente é a hanseníase, você não vai ter medo da doença. Não vai deixar de cumprimentar quem está doente, porque não é desse jeito que pega, vai saber que pode conviver e trabalhar junto com a pessoa”, explica Valéria. A dermatologista ressalta ainda que após 72 horas do início do tratamento já não há possibilidade de contágio.


Fonte: Portal da Saúde (www.saude.gov.br)
Modelo fotográfico: Érika Camila
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